Um ofício medieval que entusiasma jovens universitários a se debruçarem sobre horas de estudos teórico e prático, em busca da excelência na construção de instrumentos musicais. Essa é síntese do que se observa em poucas horas diante de umas das turmas do curso de Luteria da Universidade Federal do Paraná (UFPR), oferecido desde 2009 pela instituição e que tem o foco na produção de instrumentos de corda: violões, violinos e guitarras elétricas.
Assim como nos demais cursos de graduação, Luteria atrai desde jovens que não sabiam qual curso escolher no momento da inscrição do vestibular, até músicos ou pessoas que já tinham contato com a produção de instrumentos. Também há um grupo da terceira idade em busca de uma nova atividade profissional ou a realização de um sonho antigo que ocupam um percentual considerável das vagas.
Só que os três anos de duração do curso acabam promovendo uma segunda seleção entre quem desiste de se formar, dada a dificuldade (um terço da turma de 30 alunos não conclui), e os que se descobrem serem aficionados pela “alfaiataria da música” e, por conta própria, acabam dedicando uma jornada de 10 horas a 12 horas para a Luteria.
Tamanho engajamento levou os três colegas do quinto período a criarem uma oficina na república onde moram, localizada próxima à Escola Técnica da UFPR. “Criamos uma regra para evitar viciar trabalhar no domingo, já que seguimos direto na confecção no próximo instrumento”, comenta o estudante Lucas Guilherme Schafhauser, 26 anos, que veio de Rio Negro (PR) para cursar Luteria. Ele descobriu a vocação pela internet e passou a construir pedal de efeito e amplificador para guitarra. Mas pensar profissionalmente na construção de instrumentos veio após ingressar no curso.
Com o colega de turma e de república, Rômulo de Almeida Rabelo, 23 anos, o apreço pela luteria veio do interesse de “saber como as coisas funcionam”. “Fiquei fascinado com tudo que pesquisei pela internet sobre luteria e, quando descobri o curso da UFPR, ainda esperei um ano para poder me inscrever no vestibular daqui e passar a estudar luteria”, recorda o estudante, que saiu de Carmo do Cajuru, município do interior de Minas Gerais, para se instalar em Curitiba a fim de aprender a profissão incomum.
O terceiro integrante, Bruno Galli Nacli, 23 anos, também veio de uma cidade pequena, do interior paulista, chamada Macatuba (40 km de Bauru) para estudar luteria. “Eu tive muita dificuldade para acompanhar a turma porque não sabia muito bem qual profissão seguir”, revela. “Mas ao término do primeiro ano e do primeiro violão pronto, tive um sentimento maravilhoso, de escutar o som um instrumento produzido por mim. E todo o esforço de passar horas trabalhando naquilo foi recompensado”, acrescenta.
O sonho comum ao trio é produzir o melhor instrumento para ser tocado por um grande músico capaz de explorar da melhor forma possível a obra desses alfaiates da música. No caso do estudante mineiro, o artista que melhor utilizaria uma viola caipira produzida por Rabelo é Almir Sater. “Certamente eu saberia até onde um instrumento feito por mim poderia alcançar”.
Tem que estudar pra valer
O curso tem uma pesada carga teórica: classes de acústica, química aplicada, desenho técnico e até língua estrangeira. Tanto é que em sua primeira turma o curso teve cerca de 60% de evasão. “Muitos alunos caíam de paraquedas, sem saber do que se tratava, e acabavam desistindo”, conta o vice-coordenador Thiago Corrêa de Freitas. “Nosso objetivo é preparar profissionais para construção de instrumentos musicais de primeira linha para o mercado de restauração e produção de instrumentos de corda, por isso somos criteriosos na avaliação”, ressalta.
Os alunos começam a pôr a mão na massa – ou melhor, na madeira – já no primeiro semestre. Todos são incumbidos de construir um violão logo no começo do curso, tarefa que leva um ano inteiro. A partir do terceiro período, começam a fazer um instrumento por semestre. Apesar de haver poucas mulheres no curso, Thiago garante que a causa não é a falta de força física: o segredo da luteria está no jeito, na habilidade.
Fonte: www.cacadores.parana-online.com.br