Pouca gente pensa na Islândia quando busca uma referência de ancestrais vikings. Mesmo para a maioria de nós, viajantes, os fortes, loiros e barbudos navegantes bárbaros são mais associados aos noruegueses e dinamarqueses.
Reconstituição da fazenda Stöng, soterrada por cinzas do vulcão Hekla em 1104. (Foto: © Liana John) |
Mas é justamente lá, na Islândia, que a língua falada pelos vikings se mantém sem grandes mudanças, a ponto de os islandeses serem capazes de ler os escritos originais das sagas de deuses, heróis e colonizadores do passado. E também é lá – na terra do fogo e do gelo, localizada entre a Europa e a Groenlândia – que as cinzas vulcânicas preservaram algumas moradias e instalações rurais, fornecendo os melhores retratos da vida cotidiana nos anos 900 a 1100, considerada a época de ouro desse povo nórdico.
As construções eram de placas de terra empilhadas, com estruturas e portas de madeira. (Foto: © Liana John) |
Em 1939, em Pjórsárdalur, um grupo de arqueólogos descobriu um conjunto de 20 fazendas soterradas por cinzas de uma violenta erupção do vulcão Hekla, ocorrida provavelmente no ano 1104. Entre elas, estava a fazenda Stöng, com todas as construções praticamente intactas, como os moradores as deixaram ao sair às pressas para fugir da catástrofe. Stöng foi a principal inspiração para a reconstituição de um conjunto rural, inaugurado como museu a céu aberto em 1974, com o nome de Pjódveldisbaer.
As paredes eram feitas de placas de terra apoiadas em estruturas de madeira. Não havia janelas, apenas portas e todas bem pequenas (um indicativo da baixa estatura dos vikings no Século X, como aliás, a maioria das populações humanas da época). Por dentro, o piso era de terra batida com buracos para fogueiras e suportes para caldeirões.
Sem janelas, as casas eram escuras, iluminadas apenas pelas fogueiras, feitas em buracos no chão. (Foto: © Liana John) |
Em cômodos grandes, a família se acomodava sobre tablados em camas e bancos recobertos por peles de carneiros e tecidos de lã. Alguns dormitórios eram separados por paredes internas de tábuas. As áreas de trabalho incluíam tear, cozinha e laticínio (sim, os vikings produziam coalhadas, queijos e manteiga). O banheiro era coletivo, com troncos compridos a guisa de assento sanitário e canaletas de pedra em declive, com portinhola externa, para a retirada dos dejetos (modernos e asseados esses antigos “bárbaros”, não?)
Trenós eram usados para carregar os animais caçados: focas, raposas e aves marinhas. (Foto: © Liana John) |
Ao lado das casas e dos barracões de trabalho, ferramentas e campos lavrados indicam a produção de vegetais durante o curto verão. Já os trenós de madeira e estruturas para curtimento de peles de raposa e foca mostram as principais atividades realizadas durante o escuro e longo inverno. No ano 1000, vale lembrar, a Terra vivia um breve período quente e o clima na Islândia era bem mais brando. Isso pode voltar a ocorrer nos próximos anos, devido ao aquecimento global, se as tempestades não se generalizarem (como está previsto).
A roça era cercada para evitar a entrada das ovelhas. (Foto: © Liana John ) |
A reconstituição da fazenda Stöng dá uma ideia muito clara de como viviam os primeiros islandeses, cuja chegada àquela terra data do ano 874. Para os turistas pouco familiarizados com a cultura nórdica, é uma surpresa descobrir um passado tão organizado e cheio de recursos, associado a um povo conhecido apenas pelas violentas incursões de saque às ilhas britânicas e ao continente europeu.
Mas para quem conhece a literatura islandesa e a história real por trás da caricatura, um museu como Pjódveldisbaer é uma deliciosa visita ao espaço transformado por essa gente cheia de coragem, capaz de conviver com terremotos, vulcões, geleiras e ainda criar técnicas e tecnologias imitadas por outros povos.
Elenco de Game of Thrones se prepara para filmar em Pjódveldisbaer. (Foto: Elenco de Game of Thrones se prepara para filmar em Pjódveldisbaer.) |
Quem não pretende ir à Islândia tão cedo, mas gostaria de dar uma olhadinha no cenário histórico recriado em Pjórsárdalur pode recorrer à série Game of Thrones, exibida em canais de TV a cabo. Agora em julho, alguns episódios da quarta temporada foram gravados no museu dos vikings do ano 1000.
Fonte: www.epoca.globo.com