A França conservou durante todo o Ancien Régime um caráter muito especial, derivado dos costumes particulares de cada cidade, fruto empírico das lições do passado e fixados independentemente pelo poder local, tendo em vista as necessidades de cada uma.
Esta variedade de uma cidade para outra dava ao nosso país uma fisionomia muito atraente e muito simpática. A monarquia absoluta teve a sabedoria de não tocar nos usos locais, de não impor um tipo de administração uniforme. Esta foi uma das forças e um dos encantos da antiga França.
Cada cidade possuía, num grau difícil de se imaginar em nossos dias, sua personalidade própria, não somente exterior mas interior, em todos os detalhes de sua administração, em todas as modalidades de sua existência.
As muralhas garantiam a autonomia da cidade, inclusive face ao poder real ou feudal |
Em geral elas são, pelo menos no sul, dirigidas por cônsules, cujo número varia: dois, seis, e algumas vezes doze; ou ainda um só reitor reúne o conjunto dos encargos em suas mãos, sendo assistido por um juiz representante do senhor, quando a cidade não possui a plenitude das liberdades políticas.
Muitas vezes ainda, nas cidades mediterrâneas, recorre-se ao sistema de alcaides, instituição muito curiosa.
Bergheim, na Alsácia, França, é uma outra cidade inteiramente diferente |
Em todo caso, a administração da cidade compreende um conselho eleito pelos habitantes — geralmente por sufrágio restrito ou a vários graus — e por assembléias plenárias, reunindo o conjunto da população, mas cujo papel é sobretudo consultivo.
As representações das corporações possuem sempre um lugar importante, e sabe-se bem qual foi o papel desempenhado pelo representante dos comerciantes em Paris nos movimentos populares do século XIV.
Obernai, na Alsácia, França, ainda conserva sinais de sua originalidade |
A grande dificuldade encontrada pelas comunas são os problemas financeiros.
Quase todas se mostram incapazes de assegurar uma boa gestão das riquezas, e além disso o poder é logo monopolizado por uma oligarquia burguesa, que se mostra mais dura para com o povo miúdo do que os antigos senhores feudais.
Daí a rápida decadência das comunas. Muitas vezes elas são agitadas por tumultos populares, e periclitam desde o século XIV, ajudadas nisso, é verdade, pelas guerras da época e pela enfermidade geral do reino.
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Régine Pernoud, “Lumière du Moyen Âge” - Bernard Grasset Éditeur, Paris, 1944